A bolsa pede piedade
por Antonio Luiz M. C. Costa
Defensores de demissões em massa e porta-vozes do mercado desregulamentado imploram ao Estado por Socorro
Em três dias (9, 10 e 13 de agosto), os bancos centrais da América do Norte, Europa e Ásia injetaram o equivalente a dois terços do PIB brasileiro, 395 bilhões de dólares, para tentar conter o estouro da manada e convencer fundos e bancos a aceitar os riscos usuais. O Banco Central Europeu, responsável pela parcela mais substancial do total, teve de dispor de mais fundos do que nos primeiros dias após o 11 de setembro. O Reino Unido e a China ficaram fora desse esforço, enquanto Austrália, Canadá e Suíça contribuíram significativamente em relação a seus recursos.
Por enquanto, o Fed e outros grandes bancos centrais não se decidiram a baixar seus juros: a intervenção limitou-se a manter a liquidez e impedir que a taxa de curto prazo subisse além da meta atual (5,25% ao ano, nos EUA, 4% na Europa e 0,5% no Japão).
O valor injetado é bem maior que o das hipotecas estadunidenses em atraso, avaliado em cerca de 212 bilhões de dólares. Estima-se hoje que as dívidas inadimplentes vão chegar a 460 bilhões, mas o prejuízo final, após a retomada dos imóveis, deverá ser reduzido a algo próximo de 113 bilhões. Por grandes que sejam esses valores para o comum dos mortais, não deveriam soar tão impressionantes ante a escala dos mercados financeiros globais, algo da ordem de 160 trilhões em ativos (supostamente) líquidos ou mesmo os 3 trilhões administrados por 12 mil fundos de hedge em todo o mundo, segundo o economista J. Bradford DeLong.
A queda das grandes bolsas globais na primeira semana da crise, na casa dos 5%, representa por si só um valor dezenas de vezes superior ao temido prejuízo com hipotecas não pagas ao longo dos próximos anos. O problema está muito mais na súbita falta de confiança em fundos e bancos e nos derivativos e outros instrumentos que supostamente blindariam o sistema financeiro contra todos os riscos possíveis e imagináveis. Mesmo os riscos de operações que, obviamente, só podiam se sustentar temporariamente e em conjunturas anormalmente favoráveis, como foi o caso da bolha imobiliária.
Ao começarem a perder dinheiro, investidores tentam sacar parte de seus recursos para fugir de riscos reais ou imaginários ou cobrir perdas já irreversíveis em outros investimentos. Quem contou com essas aplicações de alta liquidez, fáceis de movimentar, para aplicar em ativos menos líquidos, ou seja, de retorno lento e que não podem ser convertidos em dinheiro a qualquer momento, inclusive investimentos produtivos ou empréstimos a consumidores solventes, vê-se em apuros, mesmo que seu negócio seja perfeitamente viável e rentável em condições normais. Corre risco de quebrar, apavorando ainda mais os investidores e gerando um círculo vicioso que pode acabar em catástrofe global.